sábado, 16 de agosto de 2014

ganhei de josé vicente de lima



Conhecí o Akira em 1979, quando o Movimento Popular de 
Arte ainda tentava ganhar corpo e ser reconhecido como uma 
manifestação cultural legítima. Eu tinha 24 anos de idade, já 
me achava maduro para expor minhas convicções, e encontrei 
certa barreira por causa dos meus gostos e do meu pensamento 
em relação à arte e a cultura naquele momento. Era um tempo 
difícil para qualquer um que quisesse se manifestar 
culturalmente e eu senti na época uma energia diferente que 
vinha daquele grupo de pessoas que ignoravam o perigo que 
corriam e falavam em frente ao microfone palavras de ordem e 
protesto em plena praça pública, cantavam e escreviam sua 
indignação contra o que se estabelecia no país naquele 
momento da história. Eram músicos, atores, poetas, artistas 
plásticos e outros, juntos tentando levar a arte para o povo e 
através dessa arte, a consciência dos seus direitos, a 
informação do que estava acontecendo no país e a importância 
que cada cidadão tinha na luta para que se revertesse aquele 
quadro de censura e repressão pelo qual passávamos. No meio 
desse grupo estava o Akira com seus 27 anos de idade, e que 
assim como eu, já pensava estar maduro e convicto de suas 
posições em relação ao mundo. Naquele momento me perguntei 
o que fazia ali, um cara de origem oriental, que normalmente 
estaria estudando ou ajudando os pais em algum comércio. Por 
que razão ele escrevia poemas tão viscerais e intrigantes. Ao 
mesmo tempo, veio aquela admiração normal que alguém sente 
quando vê outro expressando sentimentos que você tem, mas 
que não tem coragem de externar. O Akira escrevia o poema e 
 lia. E nos palcos, declamava. Eu escrevia e guardava. 
Estivemos lado a lado em várias ocasiões mas nunca tivemos 
um relacionamento estreito. Mas foram muitos anos de 
admiração e respeito por um daqueles que sempre seguiam à 
frente sem saber se ia se dar bem ou levar porrada. Akira já era 
um líder. Mas acho que nunca teve consciência disso. Hoje, 
passados trinta e tantos anos, qualquer um que tenha vivido os 
anos de MPA chega a essa conclusão sem dificuldades. Mas foi 
preciso que o tempo passasse, que ficassem para trás aqueles 
momentos inesquecíveis de luta e determinação para começar a 
aparecer o lado mais pessoal, particular desse batalhador que 
tinha sonhos, objetivos e a poesia como companheira. Foi 
preciso encarar dificuldades extremas para aparecer aos olhos 
daqueles que andavam ao seu lado o seu interior de homem 
determinado, lutador, falível, mas predestinado. Ele não podia 
ser um cara comum. Tentou ser. Revoltou-se, retirou-se, 
penalizou a si mesmo, mas não conseguiu. Voltou para o seu 
lugar e está aí até hoje. Seu destino é ser o principal elo de uma 
corrente que não pode quebrar. Essa corrente chama-se cultura 
da zona leste de São Paulo. E essa corrente não se quebrará 
enquanto esse japonês da cara redonda estiver por aí. Agora ele 
vem falar de velhice. questionar sua poesia e sua condição de 
figura de referência para todos nós que amamos a arte, que o 
temos como inspiração e que nos alimentamos da sua amizade 
generosa e despojada. Akira não morre mais. tem filhos, árvore 
e livro. Já espalhou pelo mundo afora um punhado de letras 
juntas que nos colocam dia após dia em contato direto com a 
realidade da vida. Hoje, apesar de separados pela distância física, 
estamos muito mais próximos de que nos tempos de MPA, 
porém, em compensação, estamos sim maduros e convictos de 
nossas posições e sabemos muito bem o valor de uma amizade 
sincera que o tempo não conseguiu apagar. E estamos juntos 
todos os dias, ora trocando idéias, ora trocando poesias. (Velho 
é o universo, Akira!) Parabéns por mais um ano de vida!

Zé Vicente.
 

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