sexta-feira, 3 de novembro de 2017

franjinha


quase não conheci o franjinha
nesses quarenta anos que o conheci
se conversei com ele uma dúzia de vezes
posso dizer que foi muito
e nossos diálogos eram monossilábicos
seu nome verdadeiro
era edivonaldo bezerra de andrade
e não sei o porque do seu apelido
coisa de infância imagino
de natureza meiga e tímida
ele era um autêntico poeta popular
um dos maiores que eu conheci
desses que simplesmente aparecem por aí
não tenho vergonha de confessar
certa madrugada chorei copiosamente
no quintal do sacha ouvindo canções de amor
que ele compôs quando morou vários meses
sozinho na serra do mar numa caverna
comendo raízes e frutas silvestres
pra curar a dor de cotovelo
de uma mulher que o trocou por outro
não tenho vergonha de confessar
que certa vez comprei um plano de saúde
de suas mãos e paguei apenas o primeiro
boleto que era a comissão do vendedor
e depois dei o maior calote na seguradora
franjinha devia ter uns 66 anos de idade
ele que fora boxeador na juventude
inclusive fora campeão paulista de boxe
na forja de campeões kid jofre de 1968
não conseguiu mais fintar e se esquivar
dos jabs, diretos e uppercuts desferidos
pela solidão, abandono e miséria
da porra dessa vida
e beijou a lona pra sempre
pra nunca mais levantar

akira - 29/10/2017.


obscuro


nunca foi tão claro
mas tudo é tão obscuro
nunca foi tão patente
mas o brasil é tão obstante
tão espúrio
e nada é bastante
nunca foi tão óbvio
mas tudo é tão dúbio
nunca foi tão evidente
mas o brasil é tão débil
tão ambíguo
e nada é tão exíguo
nunca foi tão tanto
mas tudo é tão absorto
nunca foi tão factível
mas o brasil é tão absurdo
mudo, cego e surdo
e nada é tão abstrato

akira - 20/10/2017.

cida santos no blablablá da casa amarela


comadres e compadres, atenção. a historiadora e escritora Cida Ferrari Dos Santos virá a casa amarela na próxima sexta feira - 27/10, a partir das 19h, para falar de dois livros essenciais para a compreensão da resistência ao regime militar na zona leste de sampa nos anos 1970 e 1980:
1. o "zona leste, meu amor" 
2. o "zona leste fazendo história"
neste dois livros, cida fala deste importante período da historia brasileira na zeéle, não a partir do ponto de vista das classes dominantes deste país mas sim a partir de depoimentos das principais lideranças populares e anônimas que atuavam na época na região, espalhadas pelos diversos movimentos sociais que surgiram na época como os de favelas, contra a carestia, por saúde e por moradia, e nos sindicatos formados por trabalhadores, dentre outros.
por isso acho importante que todos venham à casa amarela na sexta feira para conversar com a cida sobre estes seus dois livros. garanto que a conversa será no mínimo esclarecedora, inquietante e profundamente inspiradora.
para terminar amo tanto o amor da cida pela nossa zona leste que escrevi há alguns anos um poema que vivo falando por aí:
na zona leste
adormecida
a manhã é cida
na zona leste
amanhecida
amanhã é cida


jardim de hideko 41


quatro gatinhos
recém nascidos
apareceram mortos
atrás da roseira
do jardim de hideko
sua mãe devorou
apenas suas cabeças
de forma cirúrgica
não há sangue no chão
nem nos corpos estendidos
de maneira idêntica
à sombra da escada espiral
que leva ao sótão
a gata lambe o corpo
do único sobrevivente
esse mormaço no ar
deve chover à tarde
akira - 16/10/2017.

vazio


de repente do nada
vai vindo aquele vazio
tão vazio aqui dentro
tipo do vazio tão absoluto
tipo do nada tão tudo
que nem mesmo a morte
pode preencher

sem deus


não sofro mais nem tenho
nenhum problema com deus
nenhuma incompatibilidade
apesar do seu significado 
além da minha compreensão
eu o entendo como necessário
para o homem e seu destino
de perguntas sem respostas
minha diferença com ele
é com seus seguidores
os que falam em seu nome
e cujas palavras promovem
a intolerância e a escuridão
os atos dos seus seguidores
incitadores de ódios e divisões
causam-me clara convicção
que deus não existe mesmo
e tudo é terra de ninguém
akira - 12/10/2017.

oliveiras blues no sarau na galeria


com as mãos plenas
de emoção e alegria
com a voz adoçada
de amizade e poesia
vou sábado que vem
ao sarau na galeria
com a mochila farta
de loucura e fantasia
com o coração cheio
de ternura e cortesia
vou sábado que vem
ao sarau na galeria
com sueli e janete
com reverência e paz
com afeto e harmonia
com rosinha morais
vou sábado que vem
ao sarau na galeria

a casa amarela no flama


resenha de escobar franelas

O primeiro convite do ensaísta Marcos Aurelio Marques e do poeta Carlos Moreira ao Akira Yamasaki foi feito em 2013. Eles organizavam àquela época a primeira edição do FLAMA - Festival Literário da Amazônia e convidaram Akira (que é poeta e produtor cultural, atuando fortemente na região leste da cidade de São Paulo), para participar do evento. Questões de agenda impediram a viagem naquele ano, e somente agora, na terceira edição do projeto, foi viabilizada.
Akira e Sueli Kimura (educadora e musa do poeta), convidaram a poeta Rosinha Morais (Guarulhos) e eu, para que participássemos também. E, convidados a discorrer sobre A Casa Amarela - Espaço Cultural, elaboramos uma apresentação interativa, batizada "A experiência cultural de São Miguel Paulista (1978-2017) - MPA e Casa Amarela".
Foi assim que chegamos a Porto Velho na madrugada do dia 2 de outubro.
A atividade ocorreu na tarde do dia 3 no Espaço Cujuba, criado e mantido pelo poeta e músico Don Lauro. Na oportunidade, fizemos uma vivência física orientada por Sueli Kimura. Logo depois, fizemos uma leitura de poemas produzidos nas décadas de 1970/80, por poetas de São Miguel. Após isso, explanamos sobre o Movimento Popular de Arte (MPA), a atualidade cultural local através dos saraus e slams (batalhas de poesia falada) e as motivações que norteiam a criação e atividades desenvolvidas pel´A Casa Amarela - Espaço Cultural. Também foram lidas poesias das safras mais recentes, contextualizando o período atual. Poetas locais - inclusive Don Lauro - também interagiram e apresentaram poemas e músicas, complementando o clima de sarau.
Na noite do mesmo dia 3, Akira lançou seu segundo e mais recente livro, Oliveiras Blues, no Teatro Banzeiros. Ele próprio, Rosinha Morais e eu fizemos leituras de alguns poemas que compõem a obra que, como sugere o título, presta homenagem ao Jardim das Oliveiras, vila onde o poeta reside desde a década de 1960, que fica no bairro Itaim Paulista, ao lado de São Miguel, na periferia de Sampa.
Visitas e passeios, troca de ideias e experiências, e uma profunda interação com artistas das mais diferenes expressões de Porto Velho, permitiram que a experiência de ter participado da 3ª edição do FLAMA indique alguns caminhos possíveis para a poesia e a literatura geral. Todos lucram com isso: Porto Velho, São Miguel Paulista, o Brasil e o mundo. E a vida, novos contornos e cores.


Escobar Franelas.




aconteceu no 60º sarau da casa amarela


homenagem a carlos moreira

amizade é moeda sem troco
por isso a palavra de ordem de hoje
é gratidão pela acolhida emocionante 
que tivemos em porto velho / rondônia
de sua comunidade artística e cultural
durante nossa participação no 3º flama
- festival de literatura da amazônia;
por isso esse salve para carlos moreira;
esse salve para marcos aurélio marques, ludimila navarrete, nayara almeida, elizeu braga, nábila magno e kenny fenix;
esse salve, salve para nilza menezes, soniamar salin, steffane santos, rubens vaz cavalcante, rafael altoma, rafael mallmann, hallisson moreira e dango bango balango tango;
esse salve especial para meu compadre adailton alves teixeira e minha super comadre selma pavanelli.
a todos um abraço grandão
um abraço de três voltas e meia
da casa amarela

akira - 10/10/2017.

60º sarau da casa amarela


sessenta saraus
sete anos de resistência
poesias e canções tantas
alegrias e abraços tantos


poema / presente do binho


aki
Akira
atraka
a
kanoa 
ki
traz
ekos
do
itaim
a
garoa
akata
o
serenim

rubens vaz cavalcante, o binho

casa amarela no flama


fotos da participação da casa amarela
no flama - festival literário da amazônia
em porto velho / rondonia
















o pôr do sol no madeira


o pôr do sol no madeira 
o pôr do sol no mar
de carlos moreira


check in


fez o check in
passou pelo bloqueio
e foi para a área de embarque
nem olhou para trás


casa amarela na abrinq


casa amarela no 17º encontro anual
da rede nossas crianças da fundação abrinq
oficina: o sarau como estratégia para o protagonismo infanto juvenil


terça-feira, 31 de outubro de 2017

último domingo


rolezinho esperto
no último domingo

meiões arriados
meia cinco de idade
meia oito de corpinho
meia dúzia de cervejas

jardim de hideko 40


meu coração me confessou
há pouco antes de levantar
que não suporta mais a flor
nem as risadas das crianças
que odeia pássaros cantando
e me pediu pra nunca mais
sair da cama
levantei assim mesmo
tinha que por o lixo lá fora
tinha que por o pé na rua
tinha que dar um murro
na insuportável luz da manhã
akira - 22/09/2017

flama







blablablá da casa amarela com márcia barbieri



jardim de hideko 39


crianças perdidas da mãe tempo
os versos estão soltos por aí
invisíveis e intocados no jardim
onde agonizam azaleias
e rondam às rosas estéreis
abelhas, insetos e colibris
versos não cheiram nem fedem
não compram leite na padaria
não levam o cachorro para passear
mas é preciso afinco obstinado
para que aconteçam no formato
de águas, ventos e destinos
akira - 15/09/2017.

casa amarela em cena na casa de cultura antonio marcos


bom dia


bom dia o quê?
bom dia porquê?
a justiça é um puteiro
o congresso legisla putarias
o governo alcovita impunidades
bom dia onde?
não há bons dias
no país do estupro
do meu repertório de frases
já deletei o bom dia
o farol está fechado
o sol está fechado
o ar está fechado
os pássaros estão fechados
bom dia é o caralho
akira - 01/09/2017.

eu e rosinha no sarau da maria no casarão


eu também fui
ao sarau da maria no casarão
e fiquei emocionado também
com tudo que aconteceu por lá
poetas jorrando pelo ladrão
poesia vazando à flor da pele
para celebrar a arte e a amizade
fui lá com rosinha morais
juntos falamos duas abobrinhas
e três ou quatro groselhas
com a ajuda inesperada
mas preciosa e bentivinda
da querida amiga janete amaral
que pegamos no laço um minuto
antes de começar a apresentação
fui lá com sueli kimura também
a quem agradeço este registro
feito no seu celular

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

último domingo


com meia cinco de idade
todo domingo é o último
toda dividida é dúvida
todos os gols são improváveis
com meia cinco de idade
meu coração já passou do tempo
das paixões mais fortes
akira - 27/08/2017.


movimento


o tempo se move
os caminhos se movem
o homem se move
a fome se move

akira - 26/08/2017.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

jardim de hideko 38


na manhã inesperada de sol
quando cheguei perto do jardim
fui atacado por abelhas cachorro

operárias de ferrões atrofiados
elas se enrolaram nos meus cabelos
e me deu algum trabalho tirar

na manhã inesperada de sol
o kami de hideko pendia protetor
sobre o crepúsculo das azaléias

akira - 24/08/2017.

ganhei de presente de wander porto


____ ESTADO INDEPENDENTE DE YAMASAKI ____
Uma pessoa que se faz presente
Sem nunca ter estado
É um estado, uma raiz,
Um estado de alma,
Um país;
Uma pessoa a quem se respeita
Sem nunca tê-la visto
É um ponto, uma matriz,
Um ponto de vista
Um país;
Uma pessoa por quem nos interessamos,
Uma pessoa a quem se toma a “bença”,
Uma pessoa a quem tanto apreciamos,
Uma pessoa a quem se ouve,
Uma pessoa a quem se admira,
Uma pessoa que nos comove,
Uma pessoa que nos akira,
Não é só uma pessoa,
É um encanto, um amigo, uma conversa,
É uma Pessoa em feitio de Poema,
Ou vice-versa!

Wander Porto.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

encontro de utopias: lançamento do oliveiras blues


estive sábado passado no sarau encontro de utopias, no centro cultural de são paulo, da minha amiga regina tieko, para mais um lançamento do meu livro/cd "oliveiras blues".
estive lá com dona sueli kimura e com minha comadre rosinha morais, poeta da raça dos baitas e integrante da trupe do "casa amarela em cena", que me ajudou de forma emocionante em performance de leitura de alguns poemas do livro e a quem deixo aqui a minha gratidão pelo apoio e fortalecimento.
deixo também minha gratidão eterna para a regina tieko e todos os organizadores do encontro de utopias pela acolhida tão gentil e pela amizade afetuosa e inesquecível.
muito obrigado.






jardim de hideko 37


investigo os caminhos
que possam ter sido deixados
por hideko antes de partir
para que eu os conhecesse
com meus olhos de velho

sou apenas um menino
não suporto mais esta vida
de manhãs claras
e pássaros imbecis
cantando no jardim

akira - 16/08/2017.


casa amarela em cena: melancia


casa amarela em cena: clóvis


poema / presente que ganhei de monique franco


Mais uma vez Akira ou felizidade
ontem dormi com Akira
estava frio e me esquentou
fiquei me aquecendo nas letras, rimas, sinas
que tão bem ele revelou
Oliveira Blues
o céu azul estrelou
quando acordei dei por mim
cantarolando alegria
mesmo que quase um fado
por vezes quase um fardo
do poema se ouvia
mas eu sabia
era assim
que com mestre se aprendia
fazer da vida sublime poesia.

Monique Franco, poema escrito após a leitura de ´Oliveira Blues`, maio de 2017

casa amarela em cena: dedo mole


poema / presente de aniversário que ganhei de wander porto


___ AKIRA ___
(Uma cantiga para Akira)
I-
Dentro do novo,
De pipas e gudes,
Ingênuo,
Vai o akira,
Criança audaz
Que o susto da vida,
Feroz,
Insiste em parar:
-Na infância,
Uma mochila de labaredas;
II-
Dentro dos olhos
De meios e metas,
Valente,
Vai o akira
Menino rapaz
Que o medo da vida,
Algoz,
Insiste em roubar:
-Nos ombros
Uma mochila de audácias;
III-
Dentro do tempo
De perdas e ganhos,
Composto,
Vai o akira
Homem capaz
Que a chave da vida,
Mordaz,
Insiste em trancar:
-No coração
Uma mochila de espantos;
IV-
Dentro da verve
De verbos e vozes
Crédulo,
Vai o akira
Poeta loquaz
Que o revés da vida,
Atroz,
Insiste em calar:
-Nos versos
Uma mochila de revoltas;
IV-
Invisível
Como sutura de ar
Trespassando a vida
E unindo as carnes,
Viaja o akira
No comboio das quimeras
Que o cotidiano da vida,
Falaz,
Insiste em brecar:
-Nos olhos
Uma mochila de incêndios;
V-
-Eis que o poeta akira
Escreve um verso de asas!-
VI-
E fazendo das léguas
Estradas de nós,
E fazendo das mágoas
Oceanos de voz,
Convoca a todos,
E todos chegados
Ensina-nos a voar,
Voar na frente,
Voar lá atrás,
Voar juntos,
Voar cantando atrelados
Um canto infinito
Que só o Finito nos traz.

wander porto - 08/08/2017.


puruba 4


estamos sós
temos um ao outro
e em comum lembranças navalhas
impiedosamente cortantes
dentro dos nossos olhos
estamos sós
temos um ao outro
e em comum o destino deste rio
que atravessa o sertão para acasalar
com outro rio diante do mar
estamos sós
temos um ao outro
e em comum as manhãs e noites
desse tempo de matanças que o capitalismo
promove como política estratégica de extermínio
para preservação do status quo dos que estão
no topo da cadeia alimentar
estamos sós
temos um ao outro
e em comum a floresta escura e imensa
com seus caminhos que contém
a sabedoria do mundo
que teremos que decifrar sozinhos
com nossos pés feridos e inchados
akira - 29/07/2017.