no mutirão das cataratas, por mais de treze horas, a
espera indigna na fila quilométrica sob o sol suplicia
velhinhos ceguetas;
da entrada do shopping interlar, descendo e dobrando
a aricanduva por mais de dois quilomentros, eu nunca
tinha visto tamanha concentração de velhinhos por
metro quadrado, e ainda nem eram oito da manhã;
lá estavam eles, velhinhos, velhinhas e acompanhantes,
distintos em suas roupas de domingo, centenas deles
viraram a noite na fila e ainda faziam humor com a
própria desgraça: “nem gado é pior que velho nesse
país, é do curral para o matadouro”, “vida de velho é
uma bolha de sabão e o destino, e um sopro”, tá ruim”
e vai ficar pior;
lá estavam eles, vindos de todos os bairros da zona
leste, da móoca até itaim paulista e guaianazes,
passando pela penha, tatuapé e cangaiba, belém, são
miguel, são mateus e itaquera, ermelino, sapopemba
e braz, cidade tiradentes, ae carvalho, artur alvim, vila
matilde e vila progresso, jardim robrú, jardim helena,
carrão, cidade líder e parque paulistano, patriarca,
engenheiro goulart e curuçá, todos os becos e vilas da
zona leste responderam presente e com seus velhinhos
fizeram-se representar;
lá estavam eles,
velhinhos e velhinhas
chegaram em comboio
das cidades vizinhas,
ferraz, mogi e itaquá,
suzano, biritiba e poá,
veio velho até de arujá;
lá estavam eles, vieram em todo tipo de condução, de
trem, de ônibus, a pé ou de bicicleta, de carro, carona
e até de lotação, de qualquer jeito que foi possível
chegar, com suas muletas e cadeiras de roda, velhinho
empurrando velhinho, todos trouxeram nos corações e
nos olhos embaçados pela catarata, a esperança da
claridade no sonho da cirurgia a laser para enxergar de
novo com firmeza;
lá estavam eles, chegaram em progressão geométrica
no breu da noite, em jorros de enchentes e enxurradas
enquanto a porra da fila só começou a andar às oito e
trinta da manhã, em lentos passos de conta-gotas, em
lenta e indignante judiação e tortura de velhinhos sob
sol escaldante, quem chegou ä meia-noite foi atendido
às onze da manhã;
helicópteros sobrevoaram a longa serpente humana
como urubus e o prefeito aproveitou para sorrir e
acenar para a multidão sem rosto e os ambulantes
que aproveitaram o dia para fazer a festa, enquanto
aspones risonhos distribuiam santinhos de vereadores
e deputados na maior cara de pau, com ar de quem
faz o maior favor;
“políticos filhos da puta”, entredentes e estridente um
velhinho murmura, “falta de vergonha e respeito, até
em cima de catarata de velho querem ganhar votos”.
akira yamasaki.
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