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Resenha de João Caetano do Nascimento para o meu livro/CD "Bentevi, Itaim".
O PÁSSARO SUBURBANO OU DE MINHA
LEITURA DO “BENTEVI, ITAIM”,
DE AKIRA YAMASAKI
Akira Yamasaki publicou em agosto de 2012 o livro
de
poemas “bentevi, itaim”, próximo à data em que
ele
completava 60 anos de idade. A edição foi
resultado de
uma ação entre amigos, tendo como principal
idealizador
Sílvio Kono. Além dos poemas, o livro traz
ilustrações
feitas por Heron e Will Sideralman, este é
também o
responsável pela bela capa e pelo projeto
gráfico. Junto
ao livro, vem ainda um CD com poemas de Akira
que
foram musicados por vários compositores, tendo
Sílvio
Araújo como interprete das canções.
Tive o privilégio de ler os originais. Na
ocasião, li e reli
cada poema, carregado de emoção e sequer
consegui
expressar o que sentia. Essa emoção tinha razão
de ser.
Alguns dos poemas mais antigos, eu quase vi
nascer,
percebi o embrião deles a se agitar em nossas
longas
conversas noites adentro, entre cerveja,
conhaque,
cachaça e a insone esperança.
O “bentevi, itaim” reúne “estrelas da vida
inteira”,
poemas feitos em cerca de quarenta anos
dedicados à
poesia, à reflexão sobre a vida, o sentido de
escrever e o
compromisso com o povo brasileiro, sobretudo, os
mais
desamparados. Os poemas desfilam diante de nós
numa
linguagem simples, direta, às vezes coloquial,
como se
fossem crônicas do cotidiano. No entanto, uma
leitura
mais atenta nos levará a partilhar de voos mais
altos, à
altura da águia Akira que, humilde, se apresenta
como um
terno bem-te-vi.
Doze capítulos
Os poemas foram divididos em doze capítulos que
mapeiam
as preocupações e os rumos do poeta. Akira
perpetra a
mistura improvável de certo fatalismo “então
apenas sigo”,
com a rebeldia do “não sigo por sua senda”. E
essa
contradição parece tencionar toda a sua produção
poética.
Nessa trilha, o adulto revê as sombras das
árvores
mesclarem-se ao bailar do avô bêbado diante do
menino,
num retorno, após longa diáspora, através da
memória. O velho
avô reflete-se no poeta, numa imagem distorcida
de espelho
partido, na pequena obra prima que é “Menino
Amarelo”.
No áspero caminho, o Akira também encontra um
jardim,
espaço precário de remanso, embora “o motor da
moto na rua”
mostre que a realidade não dá trégua, o que nos
resta é o
combate contra o mundo, pois esse jardim, mundo
de cores,
abrigo de pássaros suburbanos, será também
invadido pela
morte.
Pele e alma
Akira nos expõe sua pele. Mais do que isso, as
vísceras, o
fundo da alma, num rasgo profundo, talhado com
precisão, à
navalha. Vemos então o pobre subúrbio a sangrar
em festa,
numa mistura de dor e alegria, desespero e
resistência. O
poeta enlameia-se nas águas em fúria que
castigam os pobres
e emudecem o bem-te-vi. E aí, temos o pungente
“Réquiem
para seis córregos”, explosão de revolta, dor,
indignação e
amor de quem vê e convive com a noite sem fim da
miséria.
Já o poeta pai tenta transmitir à pequena prole
as lições dos
pássaros, dos ventos, das vazantes e dos
mistérios da
existência. Por isso, ele canta, amoroso, a
travessa fuga de
Clarice. Protetor, recomenda a André a arte
ancestral da paciência
e diz onde pendurar o tigre gelado da solidão.
Ele também volta o
olhar para as crianças esquecidas na “noite
gelada” e questiona o
próprio sentido da poesia, enquanto a infância
apodrece.
O amigo poeta vai além, arrisca-se a percorrer
labirintos para
talvez esquecer a herança da dor “de bar em bar,
de mesa em
mesa, medos, assombrações, incerteza”, sabendo
que o tempo
cicatriza, mas jamais cura. Então, desfilam
reminiscências de
familiares, de amigos, de gente que passa na
rua. Nessa errância
vai então se desenhando a armadilha da
existência e a
necessidade de resistir. Akira é, sobretudo, um
poeta de
resistência. Resistência à injustiça, à dor e ao
fatalismo que o
dilacera.
Há quase trinta e cinco anos, quando conheci o
poeta, seus versos
tiveram sobre mim a força de um murro. Senti,
desde o início,
uma súbita afinidade com o universo tempestuoso
daquele japonês
sisudo. O tempo passou, o poeta tornou-se mais
refinado,
profundo e, ao mesmo tempo, mais simples. Outra
dessas
contradições que tornam os poemas de Akira tão
encantadores e
inquietantes. Sob a cortina da simplicidade, está uma poesia
intensa, nascida da busca constante de uma
concepção de mundo e
do sentido do fazer poético. Ao final da leitura
do livro, fica o gosto
amargo da esperança, da coragem diante da dor
inevitável que
devemos lutar para evitar. Desobediência e
fatalismo. Esses são
ingredientes que fazem um grande poeta.
Portanto, ouso dizer:
Akira Yamasaki é um grande poeta e “bentevi,
Itaim” é um livro
estupendo.
Serviço
bentevi,iItaim
162 páginas
Formato 16 x 16,5 cm.
CD – 12 músicas
R$ 23,00
Pedidos e maiores detalhes no face do Akira Yamasaki.
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